quarta-feira, 17 de março de 2010

DIZENDO ADEUS

“Navegar é preciso, viver não é preciso”. Essa frase, há muito, trago-a na memória. E dela me aproprio para dizer que rememorar é preciso, viver não é preciso. Ou seja, é preciso trazer à memória aquilo que estava imerso nas densas águas do rio Lete. E quando empreendemos singrar contrários ao curso desse rio, navegamos por mares sempre desde antes esquecidos. Nessa demanda em busca desse graal, que desconhecemos e que é sempre um eterno devir, somos impulsionados sem nem sequer sabermos que estamos nessa empreitada. E assim com fios que muitas vezes desconhecemos, seja porque invisíveis, seja porque, mesmo visíveis, não os percebemos, vamos tecendo um bordado no qual somos mais o desenho que, ponto a ponto, está sendo confeccionado do que o próprio bordador. Espécie de Penélope, tecemos não a fim de que Ulisses retorne, mas a fim de nos conhecermos a si próprios. Ulisses somos nós mesmos. Por isso, o nosso bordado é um contínuo traçar e destecer fios a fim de compor um desenho que se nos afigura como inefável. Mesmo assim, numa empresa que não é vã, tecemos e no traçado das quase sempre nem bem traçadas linhas, um ponto une-se a outro que, por sua vez, liga-se a mais outro e, assim, vão compondo esse bordado que me revela, me desvela, me esconde, me expõe. E como sempre estamos bordando novos bordados para este grande tecido a que chamamos vida, bordamos uns, destecemos outros. Guardamos estes, escondemos aqueles. Mas todos esses bordados trazem em si as marcas não só de nós mesmos como de outras pessoas. Pessoas que nos trouxeram alguns novelos, sugeriram pontos, cores para o nosso bordado, ouviram nossas angústias diante da dificuldade em algum ponto, compartilharam nossas alegrias quando o bordado estava pronto e era preciso começar mais um outro, em um novo tecido, com novas cores, pontos novos, desenhos ainda a serem pensados. Sendo assim, gostaria de agradecer às pessoas que com um sorriso, um abraço, uma palavra de incentivo fizeram com o ano de 2009 fosse bordado com cores alegres, tão alegres que ofuscaram os matizes de tristezas que vez por outra tentavam borrar o contorno de nosso bordado de 2009.  Se, ao longo deste ano que finda, pudemos pintar o sete e desenhar o oito, acreditamos que o mais que fizemos foi bordar. E assim, pude bordar um novo cenário para mim em Monteiro, onde pude, durante os meses em que fiquei hospedado por Raquel, firmar os laços de uma amizade que começara a ser bordada nas aulas da UFCG. E hoje, eis que aquela menina que ainda pensava em trabalhar com Virgilio Ferreira (ou era outro português?) encontra-se como água para chocolate, tecendo um bordado que a eternize em vida: seja bem vinda Laurinhaaaaaaaaa. Se Raquel foi a ponta de meu bordado, a outra ponta (não sei se a direita ou a esquerda) foi Aldinida. Minha cara super-ego. Apesar de não gostar dessa forma pós-moderna de afeto, sempre receosa de me dar conselhos, tão bem vindos, para determinadas partes de meu bordado. Creio que, em Monteiro, pudemos firmar os laços que deixamos entrelaçar quando estávamos fazendo o concurso de 2007 e eu a vi andando pelas ruas de Campina como uma lady. Hoje a vejo como Inês a esperar seu Pedro. Joana, minha querida leitora, com você pude compartilhar as minhas alegrias e tristezas plasmadas esteticamente, confessando certos segredos via literatura. Também não posso esquecer dos copos de cerveja, de vinho que, solidariamente, compartilhamos, seja na pizzzaria, no Saborear, em Sertânia, ou simplesmente lá em casa. Obrigado pela sua atenção, seu carinho, seu jeito canceriano de ser. Que 2010 seja pródigo em novos contos!!! Shirley, que, antes rainha da perimetral, veio, das terras da Galícia, ser a outra ponta do meu bordado onde ficaram desenhadas as imagens e os sons da palhoça Zé Marcolino, nosso portal para o umbral onde deixamos as luzes de nossos sorrisos e o calor de nossas danças. Por fim, a você, que poderia ter sido o centro do meu bordado, mas se satisfez com um dos quadrados à sua escolha. Gostei de tê-lo conhecido, Victor, dos momentos em que assistimos a filmes, em que falamos de nossas alegrias e tristezas, mas sobretudo do momentos em que, unidos, procurávamos criar imunidade a Monteiro, tentando, quem sabe, escrever os esboços de uma estética de (nossa) existência. Se este texto se abre com dando adeus, é porque o nosso bordado de 2009 está quase concluído, é preciso escolher novos tecidos, novos fios, novas tintas para o bordado de 2010. Tudo pode ser novo, mas espero que, nas cartografias que hei de desenhar no meu bordado de 2010, vocês estejam presentes para que, aos poucos, possamos ir juntando um ponto, tecendo outro deste bordado que ainda não terminei, que ainda está se constituindo, que, a cada girar da roca de fiar, toma formas que nem sempre foram previstas por mim. Enfim, o texto é escrito é um único parágrafo, porque espero que estejamos unidos e possamos continuar compartilhando alegrias (e as inevitáveis tristezas) nessa trajetória de roteiros vários, ainda, sem ponto final, apenas reticências...    

Obrigado,
Brâmane de ouro e prata.
Monteiro, noite fria de 20 de dezembro de 2009

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